Tenho uma amiga que, pela primeira vez, ouviu fado como deve ser ouvido. Foi ontem com vista para o Tejo numa esplanada daquelas que só existem em Lisboa. Foi rodeada de gente com bom aspecto, tostas com creme de ervas e chá verde com pau de canela. Foi numa conversa cheia de passados não resolvidos, foi num jogo de cartas na mesa, foi com o sol a esconder-se num céu cor-de-rosa que não pertence à paleta de cores do Outono. Foi com olhos e cara escondidos nos óculos de sol e uma mão aflita a acalmar o quase desespero que, de repente, se ouviu Mariza a cantar. Ninguém estava à espera mas aquele choro português caiu ali muito bem. E a minha amiga ouviu e percebeu tudo pela primeira vez. E sentiu-se mais portuguesa do que nunca. E assumiu o Fado como seu.
Ó Gente da Minha Terra
"Ó gente da minha terra
Agora é que eu percebi
Esta tristeza que trago
Foi de vós que a recebi
É meu e vosso este fado
Destino que nos amarra
Por mais que seja negado
Às cordas de uma guitarra
Sempre que se ouve um gemido
Duma guitarra a cantar
Fica-se logo perdido
Com vontade de chorar
E pareceria ternura
Se eu me deixasse embalar
Era maior a amargura
Menos triste o meu cantar"
Amália Rodrigues