quarta-feira, outubro 22, 2008

Tenho uma amiga que recebeu uma carta de amor em tempo de guerra. O ser amado fez-se soldado e foi para a guerra. Uma guerra interior, que seja, numa cidade longínqua. Foi há 3 meses e volta esta semana para descanso do guerreiro. Mas volta só um bocadinho. Quando as pessoas se juntam fazem logo planos, traçam linhas, programam os próximos passos. Apresentar aos amigos, passar o primeiro fim-de-semana juntos, calcular o número de vezes que se devem ver durante a semana, apresentar à família, adoptar um animal de estimação juntos, as primeiras férias, viver juntos ou não, ter filhos ou não. A minha amiga e seu soldadinho de chumbo têm apenas um objectivo desde que se “juntaram”: o reencontro. O próximo passo desta relação é sempre e unicamente o reencontro. Nada mais. E vem aí mais um. Não se sabe quanto tempo vão aguentar o turbilhão das despedidas, a angústia da espera, a expectativa do regresso. Mas não vai mudar o prefixo do “-zinho” tão cedo. Não vai deixar de ser a picola tão cedo. Não pode, não quer. Tenho uma amiga que está a contar os dias. Para falar baixinho. Para andar de autocarro sem ter lugar, apenas um braço a segurá-la. (E nunca se sentiu tão segura.). Para estar calma e dizer parvoíces. Para o que estiver para vir. Para lembrar que durante a vida vamos brincando com bonequinhas russas até encontrar a mais pequena. A mais pequena é a minha amiga. A mais pequena sou eu, agora sim. A picola. Do seu soldadinho de chumbo.

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