Tenho uma amiga que agora está sozinha. Sozinha não. Com os paramédicos do amor! Deixem-me explicar. Sábado de Manhã. Recebo um telefonema. Do outro lado uma amiga a chorar. Por causa do amor que lhe fez mal e ela cheia de dores. De cabeça. Do estômago. Da alma. O que é que eu podia dizer? "Não te mexas, respira fundo 10 vezes, não feches os olhos, come uma peça de fruta...". Por acaso podia ter dito. Mas sou uma mulher de acção. Peguei no terceiro amigo, na malinha dos primeiros socorros e fomos. Em grande velocidade...passamos um vermelho (mas foi proque ele não viu) e eu até fiz o barulhinho da sirene. Tinau...tinau...tinau... os paramédicos do amor ao serviço dos amigos. Ou os paramédicos dos amigos ao serviço do amor. Fomos expulsos. Não temos grande jeito e ela tem um grande feitio. Depois ficou tudo bem e passamos juntos o primeiro fim de semana de Inverno. Já passou. Tirámos fotos, rimo-nos, precipitamo-nos, deprimimos - mas só um bocadinho porque não tenho paciência e o telefone até vai tocando- vimos um filme, comemos gelado, maldissemos os objectos da nossa afeição, comemos muito, chegámos à conclusão que queremos viver juntos. Chegámos à conclusão que não queremos viver juntos. Dormimos juntos. Tenho uma amiga que não está sozinha. Estamos cá para ela. Os paramédicos do Amor!
E agora... retiro um texto do blog dela que faz mais sentido do que nunca. Do mestre Miguel Esteves Cardoso.
O amor fechou a loja.
Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade.
Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo.
O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode.
Tanto faz. É uma questão de azar.
O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto.
O amor é uma coisa, a vida é outra.
A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina.
O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino.
O amor puro é uma condição.
Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima.
O amor não se percebe... Não é para perceber.
O amor é um estado de quem se sente.
O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende.
O amor é uma verdade.
É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser.
O amor é uma coisa, a vida é outra.
A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre.
Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente.
O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem.
Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz.
Não se pode ceder. Não se pode resistir.
A vida é uma coisa, o amor é outra.
A vida dura a Vida inteira, o amor não.
Só um minuto de amor pode durar a vida inteira.
E valê-la também."
(Miguel Esteves Cardoso)